Entre os dias 4 e 6 de outubro Nazaré Paulista teve sua primeira Semana de Agroecologia. O município integra o Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de mais de 7 milhões de pessoas. Organizada pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) e prefeitura de Nazaré Paulista, com o apoio de organizações do terceiro setor, o evento teve ampla participação de técnicos, extensionistas, servidores e produtores rurais da região.
A fala de abertura foi iniciada por Araci Kamiyama (SAA), coordenadora do programa de Transição Agroecológica do Governo do Estado de São Paulo, que ressaltou a importância de se realizar um evento dedicado a agroecologia na cidade pela primeira vez, seguida do prefeito Murilo Pinheiro, que falou sobre as ações voltadas ao fomento da agricultura no município nos últimos anos. João Paulo Ramos, Diretor de Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Marcelo Batista, diretor da regional bragantina da CATI, organizadores do evento, também participaram da abertura.
O dia 3 de outubro é o Dia Nacional da Agroecologia, e não por acaso, a data de nascimento de Ana Maria Primavesi. A agrônoma, uma das criadoras do conceito de Manejo Ecológico do Solo, é uma das matriarcas da agroecologia e estaria completando 100 anos na data, tema de comemoração da Semana. Para conhecer mais sobre a autora e seu acervo acesse anaprimavesi.com.br
Atualmente 14 agricultores do município integram o Protocolo de Transição Agroecológica, adotando práticas que trazem melhoria a saúde de quem produz e consome os alimentos, que puderam ser apreciados no café da manhã na Câmara Municipal, sede do primeiro dia do evento.
A primeira atividade da Semana foi realizada pela artista e contadora de histórias Vivian Catenacci, que compartilhou com os presentes o conto “Tata, Pepe e Gigi: as três gotinhas de chuva” do livro “Convenção dos Ventos” de Primavesi. A história ressalta a necessidade da presença de florestas e de um solo permeável para o funcionamento do ciclo hidrológico. Vivan também é uma Semeadora de Água, forma como são denominados os produtores rurais, parceiros do Projeto Semeando Água, e contribui com a conservação dos recursos hídricos do Sistema Cantareira ao adotar em sua propriedade rural práticas que regeneram o solo, como a presença de vegetação em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e um Sistema Agroflorestal com diversas espécies de frutas nativas da Mata Atlântica. Hiroshi Seó, outro importante expoente da agroecologia, idealizador das Ecovila Clareando, Florestando, Acampamento Franciscando e amigo de Primavesi tocou as músicas favoritas da agrônoma homenageada.
Alunos das Escolas Estaduais Fabio H. Pinola e Francisco Derosa também participaram do evento e assistiram a fala de Carin Primavesi sobre qualidade dos alimentos e sua relação com a saúde física e emocional. Em sua fala ressaltou que sua mãe sempre buscava escrever de uma maneira que fosse acessível a todos e destacou que o alimento é o final de uma cadeia que depende de solos saudáveis. Para que o solo possa fornecer todos os nutrientes (macro e micro) que as plantas necessitam ele precisa ser um solo vivo, onde os microrganismos trabalham constantemente na decomposição da cobertura de matéria orgânica e ciclagem de nutrientes.
A parte da manhã foi encerrada com a participação do Instituto Kairós, que apresentou projetos desenvolvidos em hortas comunitárias, popularização das Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANCs), fomento a grupos de consumo responsável e desenvolvimento de materiais didáticos voltados a educação ambiental. No período da tarde Ricardo Tonet, da CATI Bragança Paulista, falou sobre as políticas públicas que podem ser acessadas por agricultores, como: crédito rural, pagamento por serviços ambientais, programas de aquisição de alimentos. Tonet também abordou as possibilidades que o turismo rural pode trazer as propriedades, ao agregar uma fonte extra de renda e um novo canal para venda de produtos e serviços.
Gustavo Bricchi, técnico e extensionista rural do Projeto Semeando Água participou da roda de conversa sobre “Experiências municipais de apoio a transição agroecológica” com César Bagattini da Casa de Agricultura de Nazaré Paulista, Tiago Sartori da prefeitura de Socorro e David Rodrigues da CATI de Mogi das Cruzes. O Projeto Semeando Água atua em 8 municípios que compõe o Sistema Cantareira na implementação e transição para Sistemas Produtivos Sustentáveis.
“Quando a gente pensa em transição agroecológica, quando a gente pensa em paisagem, a gente tem que considerar que tipo de manejo está sendo empregado. Nas monoculturas de eucalipto, por exemplo, a utilização do fogo e do corte raso expõe o solo, dificultando a infiltração da água e causando erosões. O carvão e a lenha que são produzidos dessa maneira, e consumidos pelas por estabelecimentos comerciais nos grandes centros, também estão inseridos na cadeira do alimento. O desafio é elaborar soluções que considerem todos os sistemas produtivos da região, de uma maneira integral. O que mais se vê na paisagem de Nazaré são pastagens e eucaliptos e não lavouras. Como fazemos para aumentar a infiltração de água no solo? Quais são as Soluções Baseadas na Natureza que podem ser implementadas nessa paisagem? Esse é o conceito que a gente vem trabalhando no Semeando Água. O Sistema Produtivo tem que estar coerente com o ecossistema no qual ela está inserida. O primeiro passo, crucial ao desenvolvimento da agroecologia, é o diagnóstico participativo, seguido do planejamento participativo.” salientou Brichi
O segundo dia da semana aconteceu na cervejaria artesanal Rusticana, que também Semeia Água! Os participantes tiveram a oportunidade de conhecer o processo de produção das cervejas artesanais e o Sistema Agroflorestal implementado pelo Semeando Água, que fornece frutas nativas da Mata Atlântica para a criação de sabores únicos. Ana Paula, outra Semeadora de Água de Nazaré Paulista, já tem entre seus produtos a cerveja de goiaba através desta parceria entre Semeadores.
Na cervejaria o resíduo da produção é utilizado na alimentação dos animais. Também está em implementação o Manejo da Pastagem Ecológica, que traz diversos benefícios aos animais e produtores. Nesse Sistema Produtivo Sustentável os animais são rotacionados em piquetes, o que reduz a compactação do solo causada pelo pisoteio dos animais, que adentram as áreas apenas quando o capim está na altura ideal para o consumo. A melhoria do solo tem como consequência o aumento da qualidade nutricional do pasto, o que permite aumentar sua taxa de ocupação e também melhora a infiltração de água no solo, trazendo mais segurança hídrica ao Sistema Cantareira.
Neste dia foi realizada uma oficina sobre Agroecologia e as Águas, ministrada por Afonso Peche, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e de Bioinsumos e preparo de Bokashi – um excelente adubo produzido a partir da coleta de microrganismos eficientes, muito utilizado na agricultura orgânica – ministrada por Idelberto Miranda Junior da CATI. Foram realizadas outras palestras por integrantes da CATI sobre Meliponicultura (Carolina Matos), manejo de nativas na regularização ambiental (Guaraci Oliveira) e sementes da CATI (Sérgio Faria).
O terceiro dia de evento foi realizada na sede do IPÊ, Instituto de Pesquisas Ecológicas, onde os participantes puderam conhecer um pouco sobre as estratégias do Projeto Semeando Água, patrocinado pela Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, no apoio a pequenos agricultores que Semeiam Água ao regenerarem seus solos. A apresentação foi realizada por Simone Tenório, coordenadora de Políticas Públicas e Desenvolvimento Econômico Territorial do projeto.
“Os produtores rurais são os protagonistas nessa estratégia de conservação ambiental, uma vez que a mudança de uso do solo com práticas ecológicas, além de todo o potencial local para o desenvolvimento da bioeconomia como base de crescimento da região alinhado às questões climáticas. Esses modelos podem contribuir com a segurança hídrica, alimentar e promover a fixação das pessoas em suas propriedades rurais, com lucro.”
Isabela Volpato e Lídia Duarte, educadoras ambientais do Semeando Água apresentaram as ações realizadas nas escolas do município, envolvendo os jovens na construção de espaços de aprendizagem mais sustentáveis. Na sequência Andrea Pupo, coordenadora de Educação Ambiental do projeto guiou os participantes na realização da oficina “Mural do Clima”, método de sensibilização internacional que visa divulgar informações do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) e levantar reflexões sobre o papel de cada um na redução dos impactos da Mudança Climática.
O tema “Agroecologia e as Águas” foi retomado por Araci Kamiyama (Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo) na fala de encerramento, uma grande disseminadora e criadora de políticas públicas de apoio a Transição Agroecológica.
“Nazaré tem muitas possibilidades e muitas necessidades por parte dos produtores rurais. Para expandir a prática da agroecologia a gente precisava se unir: IPÊ, CATI, Casa da Agricultura, prefeitura, educação. Trazer todo mundo para conhecer o trabalho da Primavesi, que é uma base importantíssima do conhecimento agroecológico, disponível para quem quiser se aprofundar. Conhecer as políticas públicas disponíveis para aos produtores, as possibilidades apoio, como a fornecida pelo IPÊ, de insumos, como as sementes da CATI tratadas com produtos permitidos pela agricultura orgânica a preços acessíveis. A Semana é importante também para a gente se enxergar, interagir e se unir em prol da agroecologia. Porque nós somos pequenos em comparação a agricultura convencional. Não dá pra gente não se unir frente ao desafio de buscar os agricultores que não estão procurando a gente. Como nós vamos chegar até eles? O que podemos fazer daqui para frente? Por esse motivo a gente precisa construir o Plano Municipal de Agroecologia da forma mais participativa possível, para agregar todas as necessidades locais.” ressaltou Kamiyama.
A lei municipal que Institui a Política de Agroecologia e Produção Orgânica de Nazaré Paulista (PMAPO) acaba de ser publicada. A semana foi finalizada com a comemoração de um ano da Feira do Produtor Rural. A presença dos consumidores e seu interesse pela origem e técnicas utilizadas na produção de alimentos é muito importante para o fortalecimento da agroecologia e da agricultura familiar. A feira ocorre todos os sábados, das 8 às 12 horas, no Recinto de Eventos de Nazaré Paulista, localizado na Av. do Recinto, 145.